Archive for the ‘Márcio Sampaio’ Category

palavra

16/11/2022

todo o mundo fala as mesmas palavras
eu não sei falar todas as palavras
nem sequer sei falar algumas palavras
mas elas estão dentro de mim como água
prestes a se despejar sobre o encanto de um sofrimento.

eu não sei se as minhas palavras voarão
nem sequer sei se elas são pássaros
ou triste granada no campo inimigo
mas elas estarão um dia junto ao mundo
e transformarão alguma coisa em nada.

é por isso que o meu poema vem num corcel vermelho
entregando espadas de fogo aos tristes dias
É POR ISSO QUE A DOR DESTA ENTREGA É SANGUE.
com que se escreve a palavra: MORTE.

Márcio Sampaio

não

14/02/2022

Os acontecimentos me perturbam
Os acontecimentos me apavoram
Os acontecimentos me enfurecem
Os acontecimentos me provocam
Os acontecimentos me convocam
Os acontecimentos me provam

Os acontecimentos me

Márcio Sampaio

enquanto

29/12/2021

enquanto
sonhávamos com as
doces maçãs do alheamento
enquanto sabíamos a doce mel do
encantamento, confinados no fim do
mundo, no macio e néscio linho
no limbo do lençol, limitados no prazer
de nossos mútuos corpos, enquanto ilógicos
nos sondávamos sensações, sem perigo
de quaisquer sanções, sem sombras,
sem assombros,
somavam-se, longe,
irreversíveis vértebras
que comporiam a nova ordem do poder,
a desova do terror.

Márcio Sampaio

noturno de itabira

12/05/2021

Teus heróis já estão mortos:
nada te resta senão a traça
roendo a memória:

Nesta hora tardia, o príncipe
com o fio da espada acorda o relógio.
Mas o tempo não marca as estações,
nem para o trem na curva
onde há pouco esperavas
chegar o amor.

Não te consolam carros velozes,
a fórmula-um do pirlimpimpim,
o zepelim (corrida sem prêmios
nas pista esfalfada).

Nem te consola a doce carícia
de tua íssima amante.
Os heróis mortos: cisnes, fadas,
lobos. Famintas galinhas
barganham o ouro do ventre
por um prato de feijão-tropeiro.

A noite é profunda; mole e lenta
move-se a lesma
sobre a resma de papel
em que recolhes
teu último poema.

Márcio Sampaio